Era noite de 20 de setembro de 2022 quando a brasileira Karin Aranha desembarcou no Aeroporto de Guarulhos. Vinha de Londres, onde ara dez meses trabalhando como faxineira para sustentar os filhos. Esperava reencontrá-los na volta ao Brasil — especialmente Adam, o caçula, de 3 anos. Mas algo estava errado. Ninguém a aguardava no saguão, como fora combinado com o marido, o egípcio Ahmed Tarek Mohamed Fayz. Karin esperou cerca de duas horas, tentando contato com a família. Dezenas de ligações, nenhuma resposta. Aflita, pegou um táxi e seguiu sozinha para casa. Lá, encontrou o cenário de um filme de terror: portas arrombadas, móveis destruídos, documentos desaparecidos. E o pior — Adam não estava. Havia sido levado pelo próprio pai.
Karin denunciou o sumiço de Adam à Polícia Federal (PF) ainda naquela noite. Horas depois, soube da fuga de Ahmed com o filho pela Ponte da Amizade — principal rota terrestre entre Foz do Iguaçu, no Brasil, e Ciudad del Este, no Paraguai. De lá, não se sabe como, conseguiram embarcar para Madri. O destino: Cairo, a capital egípcia. O aporte da criança não continha autorização para viajar com só um dos pais. Mesmo assim, Adam deixou o Brasil. Falha jamais explicada pela PF.
O caso de Karin é um exemplo do chamado “golpe do noivo” (leia o box no fim desta reportagem para entender a história).
O sonho virou pesadelo
Karin conheceu Ahmed em 2017, pelas redes sociais. O encantamento rápido a levou à terra natal do futuro marido. Poucos meses depois, estavam casados. Em 2018, mudaram-se para o Brasil. Mas o que parecia sonho virou pesadelo. Depois do nascimento de Adam, Karin ou a sofrer agressões de Ahmed. Ela chegou a obter medida protetiva contra o marido, mas decidiu preservar o casamento.
Quando começou a pandemia de covid-19, Ahmed estava desempregado. Karin, com mais de 20 anos de experiência no comércio, tentava retomar a carreira, mas as restrições sanitárias frustraram seus planos. Sem renda, ela aceitou a sugestão do marido: trabalhar como faxineira em Londres. Haveria mais oportunidades, e a renda seria maior. Ahmed prometeu cuidar dos filhos até o retorno de Karin, que também é mãe de outro menino, de 20 anos, fruto de um relacionamento anterior.

Adam tinha 3 anos e 8 meses quando desapareceu. Hoje, tem 6 anos. Desde o sequestro, está incluso na “lista amarela” da Interpol como criança desaparecida. O pai é considerado foragido e consta na “lista vermelha”, com mandado de prisão e pedido de extradição pelo Brasil.
A angústia de Karin no Egito
Ahmed vive livre no Egito. Compareceu a pelo menos duas audiências no Cairo, mas nem a Interpol nem as autoridades brasileiras compareceram. “Ele teve coragem de entrar num tribunal e ninguém o prendeu”, diz Karin. “Ele está ao alcance da Justiça, mas o mundo finge não ver.”
Decidida a lutar pelo filho, Karin vendeu o que tinha, arrecadou doações e mudou-se para a capital egípcia em julho de 2024. Converteu-se ao islamismo, aprendeu árabe e alugou um quarto modesto. Atualmente, vive de doações de brasileiros que se sensibilizaram com sua história.
A Justiça egípcia negou a guarda de Adam a Karin por causa de uma fotografia antiga. Na imagem, divulgada no Instagram, a brasileira aparece ao lado de uma amiga em um restaurante. Brindava o aniversário da colega com uma taça de água com gás. A Corte interpretou a cena como apologia do consumo de bebida alcoólica. Isso a tornava indigna aos olhos dos muçulmanos. Por esse motivo, a guarda de Adam caiu no colo da avó paterna. De lá para cá, Karin trava uma guerra desigual: sozinha num país estrangeiro, sem renda, com um visto que a proíbe de trabalhar e impedida de ver o filho.
“Peço ao presidente Lula que faça um acordo com o Egito”, suplica Karin. “Há uma relação amigável entre os dois países. Adam precisa ser repatriado. Está sem contato com a mãe há dois anos e dois meses e vive em condições precárias.”
Vanessa Paiva, advogada da brasileira, ressalta que Karin tem o direito de recuperar a criança. “O problema agora é no Egito”, explica. “O posicionamento do governo brasileiro é nulo. A gente luta, clama por Lula e não recebe nenhuma resposta. Só ele poderia agilizar o processo. É uma questão diplomática.”

Diplomacia frágil
Karin pediu ajuda ao Itamaraty, ao Ministério da Justiça e à Polícia Federal. Também buscou apoio de parlamentares, como Damares Alves (Republicanos) e Mara Gabrilli (PSD), que acompanham o caso. Até Macaé Evaristo, ministra dos Direitos Humanos, reuniu-se com autoridades egípcias em Genebra. Nada surtiu efeito.
“A omissão do governo brasileiro é revoltante”, desabafa Karin. “Meu filho saiu do país sem autorização. Isso é crime. Agora, o mesmo Estado que falhou em impedir a saída de Adam se recusa a trazê-lo de volta.”
Karin ou por três advogados, entre Brasil e Egito. Sua última esperança: uma audiência judicial, marcada para 30 de julho, no Cairo, pode reverter a guarda de Adam.
Mães da Sharia
De acordo com a Sharia, considerada a principal lei islâmica, a guarda dos filhos deve ser da mãe. Mas começam a surgir exceções. Cada vez mais, aumenta o número de relatos de mulheres ocidentais que têm os filhos retidos em países sob domínio muçulmano. A essas vítimas deu-se um nome: “Mães da Sharia”.
Esses casos fogem das regras da Convenção de Haia, que obriga países signatários a devolverem imediatamente crianças levadas ilegalmente para o exterior. O Brasil segue o acordo à risca: mães brasileiras que fogem de outros países com os filhos, por exemplo, são obrigadas a devolvê-los quando chegam aqui. Mas o Egito, onde a Sharia prevalece, não é signatário dessa convenção.
“Estou lutando há dois anos e oito meses”, diz Karin. “Peço apenas o direito de ser mãe do meu próprio filho. Gostaria que o Brasil repatriasse Adam. Ele é brasileiro, o retiraram sem autorização. Está em cárcere privado. A nossa vida é no Brasil, não no Egito.”

Leia também: “Por que devemos lutar pelo direito de criticar o Islã”
O islamismo é cruel em suas leis, são tiranos.Nesse caso qual foi o policial federal que permitiu a saída da criança sem a autorização escrita e assinada (com firma reconhecida)pela mãe?É crime.